Matay e o SONHO DO FESTIVAL: «Só Deus sabe o quão eu estou feliz!»

Participar no Festival RTP da Canção era apenas um sonho para Matay. Mas eis que, em 2018, recebe não um mas dois convites para o certame de música! O cantor conta como tudo aconteceu.

14 Fev 2019 | 19:01
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Aos 32 anos, Matay concretiza um sonho: participar no Festival RTP da Canção. Com uma sólida carreira no mundo da música, Rúben Matay Leal de Sousa é, no dia-a-dia, animador sócio-cultural de profissão e trabalha no Centro Social Polivalente do Bairro da Boavista, em Lisboa, que pertence à Santa Casa da Misericórdia.

O músico revela-nos em exclusivo como se apaixonou pela ideia de, um dia, subir ao palco do Festival da Canção e revela como, com fé e trabalho, se podem alcançar todos os sonhos. Matay é um dos oito artistas a subir a palco na primeira semifinal do Festival, este sábado, 16 de fevereiro, na RTP1.

 

O Matay atua na primeira semifinal, este sábado, 16 de fevereiro. Como estão a correr os ensaios?

Está a ser giro ensaiar e perceber de que forma vou melhorando pequenos aspectos da música para tentar fazer o melhor. O Tiago [Machado] é um músico muito metódico e tem-me ajudado bastante.

Como surge o convite para participar no Festival da Canção?

O Tiago pediu o meu número ao [Boss] AC sem lhe explicar para o que era e, entretanto, convidou-me. Disse-me que aceitava o convite da RTP se eu participasse com ele. Rapidamente fiquei logo com um brilho nos olhos. Disse-lhe ‘vamos os dois a essa aventura!’. Pedi-lhe para me enviar a ideia dele para, depois, avançarmos com uma proposta.

Entretanto, dois dias depois, liga-me o [Boss] AC a fazer a mesma proposta (risos)! Eu disse-lhe que o Tiago me tinha ligado a fazer o mesmo convite e sugeri que nos juntássemos. Juntámo-nos e saiu o Perfeito.

A sua atuação vai ser a mais despida de todas, uma vez que é apenas a sua voz e o Tiago ao piano.

É verdade! Mas sabe que a minha relação com a música é, assim, íntima. Eu acho que esta música me permite, apesar dos nervos e da responsabilidade que é participar no Festival da Canção… para mim… e não sei como é para as outras pessoas mas tenho um sentimento muito especial…

Era um sonho?

Sem dúvida! Isto é uma coisa muito especial. Eu tenho vivido coisas através da música que só Deus sabe. Só Deus sabe o quão estou feliz à conta disto tudo. Lembro-me de ver a atuação da Filipa Azevedo [vencedora do Festival RTP da Canção 2010] e pensar ‘um dia, quero fazer isto!’. O topo disto é poder representar Portugal. Se for, há-de ser uma coisa especial.

Eu tenho 32 anos e há uma série de atuações [do Festival da Canção] que eu não vivi no momento. Entretanto fui ver e já vi coisas incríveis! Já vi que o TC [Tó Cruz], um brother meu…

Tó Cruz… com Baunilha e Chocolate [vencedor do Festival da Canção em 1995]!

Sou fã do TC! E a pessoa que a canta é assim muito especial. Acho que este despertar para o Festival aconteceu lá atrás. Mas, como eu dizia, a música tem-me ajudado a realizar uma série de sonhos. E é isto: eu sonhei e isto aconteceu. Eu sou crente, isto tem uma carga emocional muito grande.

Tenho pensado nas coisas e, por algum motivo, as coisas têm chegado até mim. E é isso que está a acontecer com o Festival. No ano passado, estava a passear com a minha família no Parque das Nações e disse ‘gostava de cantar aqui no Altice Arena’. E, entretanto, surgiu um convite para eu poder cantar lá! Eu sou muito grato à conta disto tudo.

 

«Se não forem os exemplos positivos, não conseguimos dar esperança a ninguém»

 

Como é que a mulher [Maria] e os filhos [Santiago e Vicente] reagiram quando lhes disse que ia participar?

A minha mulher é muito terra-a-terra, muito pragmática. A primeira coisa que ela me disse foi ‘ok, não nos vamos já deslumbrar. Vamos ver se isto tem pernas para andar e vamos acreditar mais tarde’. Eu tenho um bocado disso e até costumo dizer que sou filho de São Tomé, tenho de ver para crer. Neste caso, lá em casa, toda a gente ficou fascinada com a ideia a partir do momento em que conhecemos a melodia e nos apercebemos de que isto era real. A família está toda na frente desta luta, estamos todos de braço dado.

O Matay trabalha no Centro Social do Bairro da Boavista, em Lisboa. Como é que eles reagiram quando souberam que ia ao Festival da Canção?

Foi incrível! Até recebi um email do provedor da Santa Casa [da Misericórdia] a dar-me os parabéns. Não é só o bairro da Boavista que me tem dado força mas, ao nível da Misericórdia de Lisboa, tenho recebido um apoio fantástico!

Como é que a música surge na sua vida?

Uau… a música surge bem lá atrás, quando era garoto. Lembro-me de ouvir a minha mãe cantar Don’t Cry for Me Argentina, I Will Always Love You, da Whitney [Houston], e eu ficava maravilhado a ouvi-la cantar. A música está na minha vida desde sempre. Em miúdo, cantei no coro da Casa Pia. Fiz umas peças de teatro e, entretanto, comecei a fazer pequenos concursos de karaoke. Participei num na Santa Casa e ganhei! Houve uma senhora que, no ano seguinte, me disse que tinha uma vaga garantida num coro de gospel. Eu não sabia bem o que era o gospel mas tive sorte, fiquei bem classificado e entrei para o coro das 100 Vozes. Foi o gospel que me deu estrutura, brilho na voz, este feeling, esta forma de estar na música.

Sente-se um exemplo para os miúdos com quem trabalha? Porque não é fácil singrar quando se vem de um meio mais desfavorecido. O próprio Matay cresceu num sítio onde as oportunidades não surgem todos os dias [nr: o cantor cresceu em Chelas, Lisboa].

Sem dúvida, mas podia não existir a música e, em condições normais, eu deveria ser esse exemplo para os meus miúdos. Tal como disse, às vezes, as condições dos bairros são difíceis e o que se vive no bairro, por vezes, é difícil. E se não forem os exemplos positivos nós não conseguimos dar esperança a ninguém. Isto do exemplo vai além de ser artista.

O que ser artista traz é esperança e mostra a algumas comunidades que, se nós trabalharmos, se sonharmos, se lutarmos por isso, podemos conseguir lá chegar. É isso que eu, enquanto artista, posso levar a estas comunidades. Mas, na realidade, é superior a tudo isto. Nós vemos tantos exemplos negativos. Nos bairros existem pessoas que roubam, que traficam, que batem, que matam, mas também existem pessoas de bem, que trabalham, que lutam diariamente, sem ver o sol e que procuram uma vida melhor, grande parte das vezes, não para eles, mas para dar a alguém. E eu venho disto. Na Misericórdia, é isto que eu pretendo deixar aos meus miúdos. Eles podem ter o sonho que quiserem mas têm sempre de ser pessoas dignas.

Quem gostaria de ver, além de si, na final do Festival da Canção?

Gosto muito dos Calema. Tudo o que estiver dependente do gosto de alguém está sempre em aberto, ainda que existam sondagens e grupos que irão votar em massa. Contudo, simpatizo também com a Soraia [Tavares], acho que ela tem uma canção gira.

 

 

E vou a jogo com fair-play. Seja o que Deus quiser! Já está a ser um sonho participar. Mas não vou ser hipócrita. O sonho é chegar mais longe, é poder representar Portugal. Se for outro, ’tá-se bem. Não fico mais triste por isso.

 

Veja mais: Soraia no FESTIVAL: «Vai ser a primeira vez que o meu pai me vai ouvir ao vivo»

 

Texto: Raquel Costa Fotos: Arquivo Impala e redes sociais

 

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