Cristina Ferreira voltou para a TVI há dois anos. Os fracassos e os sucessos da diretora

A 17 de julho de 2020, foi anunciada a saída de Cristina Ferreira da SIC e o seu regresso à TVI. Desde então, muito mudou no canal de Queluz de Baixo.

17 Jul 2022 | 9:00
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Cristina Ferreira regressou à TVI há dois anos. “Que notícia absolutamente invulgar…”, comentava José Alberto Carvalho, em jeito de desabafo, na abertura do “Jornal das 8” de 17 de julho de 2020, o dia em que foi anunciado o surpreendente regresso da apresentadora a Queluz de Baixo.

O tom usado pela SIC, horas antes, era consideravelmente diferente. Afinal, tinha acabado de perder o seu maior ativo, que contribuíra indiscutivelmente para a chegada à liderança, dando a cara por um projeto que entrou na história dos programas matinais da televisão portuguesa. “A SIC lamenta a decisão abrupta e surpreendente, mas apesar da desilusão, quer agradecer o trabalho de Cristina Ferreira desenvolvido ao longo deste curto mas intenso período, no seio de uma equipa vencedora, que continuará a empenhar o seu talento e profissionalismo para merecer a confiança do público”, contra-atacava, alertando logo: “A SIC informa ainda que reserva todos os seus direitos em face desta situação.”

Ainda o mercado estava a recuperar do terramoto provocado por Cristina Ferreira quando, em agosto seguinte, o alerta dava lugar a um ultimato. A estação de Paço de Arcos deu 15 dias à apresentadora para esta pagar uma indemnização no valor de… 20.287.084,54 euros! Mas a então nova patroa da TVI logo refutou. “A referida quantia não tem qualquer fundamento ou base contratual”, disse, em comunicado. Foi, então, instaurado um processo contra a malveirense, que continua sem grandes novidades. E já se passaram quase dois anos… “Está tudo na mesma. As audições estão apontadas para começar no final do ano”, afirma agora, à TV 7 Dias, uma fonte ligada ao processo. Cristina Ferreira, vale a pena lembrar, só está disposta a desembolsar qualquer coisa como 2,3 milhões de euros, o correspondente ao valor dos 29 meses de trabalho que não cumpriu quando, unilateralmente, rescindiu o contrato de exclusividade com a SIC.

Cristina Ferreira não está preocupada com vitórias da SIC

Prevê-se uma longa e intensa batalha judicial, com troca de acusações que se juntarão às já feitas por ambas as partes. Enquanto isso não acontece, Cristina Ferreira continuará a insistir no que tenta fazer desde o seu regresso à TVI: alcançar a liderança das audiências. Mas a diretora de Entretenimento e Ficção não se mostra preocupada com os 41 meses de vitórias consecutivas da SIC. “Podem vir mais 40 que nós continuaremos a batalhar para que isso [a vitória] aconteça”, diz, mantendo-se focada no essencial: “Eu sei as minhas circunstâncias, eu sei o que posso fazer, eu sei que coisas posso ou não fazer na minha grelha… Por isso, [estou] muito tranquila, muito feliz. O reconhecimento de quem está ao meu lado deixa-me ainda mais tranquila em relação a isso. Portanto, é continuar a trabalhar e acordar todos os dias com vontade de lá estar, porque isso é o principal.”

Este é um discurso que a apresentadora salienta vezes sem conta, recusando a ideia de rivalidade. “É óbvio que sei que estou a competir. É óbvio que, no dia a seguir, às oito e meia da manhã, eu sei os resultados daquilo que aconteceu no dia anterior. Mas não é isso que me norteia. Acima de tudo, tento fazer na TVI aquilo que me é possível e tento fazer o melhor que sei e que as minhas equipas conseguem fazer. O que os outros fazem não me diz respeito. Não posso alterar nada do que os outros fazem. Só posso alterar o que eu faço”, defende.

A poucos metros de distância do rival Daniel Oliveira – os dois estiveram novamente juntos na semifinal dos International Emmy Awards 2022 que decorreu em Lisboa –, Cristina Ferreira diz ainda: “Nós somos tão poucos, isto é tão pequenino, já trabalhámos todos uns com os outros… Acho que não faz sentido algum que haja esse tipo de rivalidades e eu sou a primeira a não querer que isso exista. Agora, há aqui outras circunstâncias que levam a que as pessoas tenham esse tipo de atitudes, que me deixam um bocadinho mais triste. Mas é o que é… Portanto, da minha parte, nunca terão qualquer sentimento de rivalidade, de raiva ou de que quer que seja. É óbvio que cada um está a fazer o seu trabalho, é óbvio que cada um, como numa corrida, quer chegar primeiro à meta. Mas isso é tão de salutar como dois corredores de maratona que, no final, se abraçam porque um ganhou e o outro ficou em segundo lugar mas tentaram os dois fazer o melhor.”

Os sucessos e as derrotas de Cristina Ferreira na ficção

Dois anos depois de Cristina Ferreira ter batido com a porta na estação de Paço de Arcos, o balanço é claro. Numa altura em que a televisão generalista está a perder telespectadores, semana após semana, mês apôs mês e ano após ano, com público a migrar para o Cabo e para as plataformas de streaming, a estação de Queluz de Baixo continua longe do principal, mas pouco verbalizado, objetivo. Junho foi, aliás, o mês deste ano em que se registou uma maior distância entre a SIC e a TVI (16,2% de share contra 14,9%).

Há, ainda assim, alegrias de que a malveirense se pode vangloriar: a novela “Festa é Festa” mantém-se líder indiscutível de audiências 14 meses depois da estreia. E a marcar tendências, sublinha Cristina Ferreira. “Nós fomos os que arriscámos. Quando chegámos com ‘Festa’, houve muita gente, até internamente, que tinha dúvidas, porque o humor nunca tinha tido muito impacto e muito sucesso numa novela. Foi um risco e correu bem. Depois, já outras estações o fizeram”, atira, numa clara referência, por exemplo, às recentes novelas das SIC com uma forte aposta nos núcleos de humor.

“Quero é Viver” também já vence em relação à ficção rival e até “Para Sempre”, “que começou de uma forma mais lenta, já ganha quase todos os dias”, salienta a diretora. O mesmo não se pode dizer de “Rua das Flores”, que veio repetir a fórmula de “Festa é Festa” no horário das 19 horas. A responsável da TVI reconhece o fracasso. “Rua das Flores, que tem um lado mais cómico, não correu bem. Está num horário difícil e não conseguimos implementar, embora ‘Rua das Flores’ fosse muito diferente de ‘Festa é Festa’. Mas a televisão faz-se disto, de experimentação, e eu tenho que honrar os 500 mil que vêem todos os dias a ‘Rua das Flores’”, diz apenas. Na verdade, são menos de 500 mil espectadores. São, aliás, muitos os dias em que a novela cómica fica muito abaixo da fasquia dos 400 mil espectadores, números alarmantes para a faixa em que é exibida e para o investimento que neste produto de ficção foi feito. Confrontada com o suposto descontentamento do elenco de “Rua das Flores” com Cristina Ferreira, esta é radical na resposta: “Ah… Eu gostaria que as apreciações que fossem feitas aos produtos da TVI fossem igualmente feitas aos produtos de outras estações de televisão.”

“Big Brother” com baixo orçamento

“Dois às 10”, com Cláudio Ramos e Maria Botelho Moniz, e “Goucha”, com Manuel Luís Goucha, revelam-se, por sua vez, apostas certeiras da direção de Entretenimento e Ficção da TVI, com vários dias na liderança das audiências. E, quando não vencem, mordem os calcanhares dos respetivos concorrentes, salvo raras exceções. O mesmo acontece com “Em Família”, apresentado por Ruben Rua e Maria Cerqueira Gomes. “Conta-me”, alternadamente conduzido por esta última e Goucha, tem uma liderança sustentada do seu lado. O mesmo já não se pode dizer que os dois apresentam em conjunto: “Uma Canção Para Ti”. Depois de uma estrela sólida, a última emissão já perdeu para a SIC.

Como Cristina Ferreira diz, “setembro é já amanhã” e, portanto, que venha (mais uma edição de) “Big Brother”. Será a oitava (!) em pouco mais de dois anos. Ou seja, neste período, mais de 18 meses da programação da TVI foram ocupados pelo pai de todos os reality shows. Desde janeiro, com a própria diretora ao leme deste barco, o que deverá voltar a acontecer com a nova temporada. “Porque é que vocês acham que é um [programa com concorrentes] anónimos? No dia em que vocês souberem o que nós vamos fazer, aí, sim, eu desisto”, ri-se Cristina Ferreira.

As inscrições – para anónimos… – estão abertas há algum tempo. “Os castings já arrancaram e, sim, é com participantes anónimos”, confirma à TV 7 Dias fonte da produtora Endemol, acrescentando: “Vão existir algumas alterações na casa, como costuma acontecer em todas as edições. Mas, por muito que quisessem fazer uma coisa muito diferente, o orçamento não é muito…”

Texto: Dúlio Silva, Luís Correia e Tânia Pereira Dias; Fotos: Reprodução redes sociais
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