«Esgotada» e «cansada» foram dois adjetivos que, ao longo de mais de uma década, fizeram manchete ao lado do nome de Alexandra Lencastre. Fosse pela boca da própria, que se queixou amiúde do cansaço de ritmos intensos de gravações dos vários projetos de ficção pelos quais passou, fosse através de fontes mais ou menos próximas, que indiciavam um excesso de trabalho.
Mas, na última entrevista antes da mudança para a SIC, concedida à TV 7 Dias em junho de 2019, a atriz de 54 anos falava de «lealdade» à TVI mas também confessava um sentimento ambivalente por estar prestes a voltar às gravações, na altura do arranque de Na Corda Bamba. E há uma palavra que se destaca: «avaliação».
Questionada sobre o hiato na representação, que começou após o fim das gravações da novela A Única Mulher, Alexandra Lencastre respondia: «Estou com uma perspetiva sobre o trabalho, as minhas qualidades, os meus defeitos, a minha entrega e a lealdade à TVI e aquilo que eu posso fazer e aquilo que eles me pedem para eu fazer, portanto estou a fazer uma espécie de uma avaliação. Sinto-me um bocadinho de fora, espectadora, a perceber o que me está a acontecer. Não imaginava nada chegar a esta altura da minha vida a fazer o que estou a fazer.»
«É bom descansar da ficção, mas, por outro lado, tenho muitas saudades. Provavelmente, eu agora teria feito uma participação maior num filme, se soubessem que eu tinha disponibilidade, mas as pessoas também têm muito a ideia de que eu estou completamente absorvida pela TVI e não tenho tempo para nada. Foi uma ideia que se foi instalando e eu, às vezes, perco convites e fico triste, mas também não posso andar aí no Instagram a dizer: ‘I’m free, i’m free.’ [‘estou livre, estou livre’]. Às vezes, tenho vontade que as pessoas saibam que eu tenho disponibilidade. Neste momento, olho para os meus colegas que estão a fazer novela com uma mistura de pena e inveja, mas tudo muito puro», refletia Alexandra Lencastre.
Oito meses depois desta conversa, que pode ler aqui na íntegra, Alexandra Lencastre está finalmente livre. Com vínculo informal com a estação de Paço de Arcos, a diva da ficção televisiva portuguesa voa agora por conta própria, numa casa que conhece bem e que a transformou da inocente Guiomar da Rua Sésamo (RTP1, 1989) para sex symbol nacional, impulsionada pelo mítico formato Na Cama Com…, no qual Alexandra Lencastre entrevistava políticos, músicos e outras figuras públicas… na cama.
Rui Vilhena e o primeiro Emmy Internacional
A história da SIC cruza-se com o percurso profissional de Alexandra Lencastre mas a consagração como estrela maior do star system português acontece graças à TVI. A atriz integra a estação de Queluz de Baixo em 2003 para interpretar o papel de uma ama ex-stripper em Ana e os Sete, sitcom que foi um êxito de audiências e na qual fazia par romântico com o ex-marido, Virgílio Castelo. Que, de resto, vai ter como colega na SIC.
Entre 2003 e 2019, protagonizou 9 novelas e 2 séries. Na ficção, foi rosto dos maiores êxitos do canal invicto até 2019. Rui Vilhena é o elo simbólico desta história. O princípio e o fim de Alexandra na TVI. Coincidência, ironia ou destino, a primeira novela de Alexandra na estação de Queluz de Baixo é da autoria do guionista brasileiro. E a última também.
Ninguém como Tu, em 2005, marca a estreia de Alexandra Lencastre nas novelas da TVI e logo com uma das suas personagens mais memoráveis, a maquiavélica Luiza Albuquerque. A trama de Rui Vilhena ainda hoje é recordada pela célebre pergunta: ‘quem matou António?’ (interpretado por Nuno Homem de Sá, que também reencontrou em Na Corda Bamba).
Em 2006, protagonizou a super produção Tempo de Viver, também da autoria de Rui Vilhena, ao lado de Margarida Vila Nova. A dupla Fátima e Maria Laurinda faziam o gáudio dos fãs.
Em Fascínios, logo no ano seguinte, Alexandra deu vida a Margarida Miranda, uma mulher ambiciosa. Entrou numa das maiores produções de sempre da ficção televisiva portuguesa, Equador (a adaptação do romance homónimo de Miguel Sousa Tavares), em 2008, dando vida a Maria Augusta da Trindade.
Mais um ano, mais uma novela. Em Meu Amor (2009), a atriz volta a ser protagonista, desta vez lado a lado com Margarida Marinho. A novela viria a ser a primeira portuguesa a vencer um Emmy Internacional. 2009 marcava o ano de estreia de Alexandra Lencastre como entrevistadora na TVI24. com Conversa Indiscreta. O primeiro convidado foi o então treinador do Benfica Quique Flores e o último Manuel Luís Goucha.
2010 foi um ano de pausa, um dos poucos para Alexandra Lencastre. Em 2011, a atriz regressava à ficção na novela Anjo Meu, vestindo a pele da protagonista Joana Rita Saraiva.
De atriz a jurada de talent shows
No ano seguinte, Alexandra Lencastre inicia a era de participação em talent shows como jurada. Foi quase totalista de A Tua Cara Não me é Estranha, tendo falhado apenas a terceira edição, onde foi substituída por Fernanda Serrano. Em Dança com as Estrelas, compareceu à chamada nas quatro edições, integrando o painel de jurados do formato. Entre 2012 e 2019, a atriz integrou 11 edições regulares e especiais de talent shows da estação de Queluz de Baixo.
Em 2013, regressa às novelas, em Destinos Cruzados, novamente da autoria de António Barreira. Na trama dá vida a duas personagens, Sílvia e Laura. Dois anos depois, integra aquela que seria uma das mais longas novelas da estação de Queluz de Baixo, A Única Mulher, na qual deu vida a Pilar, a maquiavélica mãe de Luís Miguel (Lourenço Ortigão). Em 2017, volta aos papéis de vilã, com Caetana Rivera, em A Herdeira. Na Corda Bamba, que se estreou ainda em 2019, Alexandra Lencastre reencontra-se com Rui Vilhena, naquela que seria a sua derradeira novela da TVI
Alexandra regressa agora à SIC, quase 18 anos depois, com ‘fúria de viver’. O nome, de resto, da novela que protagonizou ainda em Carnaxide, em 2002.
Texto: Raquel Costa | Fotos: Arquivo Impala